O universo castrejo do norte
de Portugal deu a conhecer, até ao momento, cerca de três dezenas de estátuas
de guerreiros galaicos, assim conhecidos por se enquadrarem numa área
geográfica designada “Callaeci”, correspondente ao noroeste português.
É mais ou menos consensual que
estes guerreiros foram esculpidos por grupos de artistas ambulantes, que aqui e
ali construíram a sua arte.
Referimo-nos a uma época
Proto-histórica, num período designado Idade do Ferro, com início no 1º milénio
a.C.
O noroeste do nosso país foi
profusamente ocupado nessa altura, com a implantação de povoados fortificados,
localizados preferencialmente, em locais bem defendidos naturalmente. Tribos heterogéneas ocupavam estes povoados, digladiando-se frequentemente. Eram
comunidades guerreiras, com uma hierarquia bem definida na qual os chefes
tribais desempenhavam um papel muito importante. As estátuas dos guerreiros
seriam portanto, representações iconográficas ligadas ao culto de chefes
heroificados, talvez com a glorificação de antepassados. Estrabão relata que
eram oferecidos a esta divindade guerreira, sacrifícios de animais e de
prisioneiros, associados a práticas divinatórias de lustração, exaltadas pelo
Homem castrejo em cerimoniais junto do “icon” guerreiro, antes e depois das
contendas. Alguns autores apontam a localização destas estátuas nas entradas
principais dos povoados.
A estátua de guerreiro galaico
de Santo Ovídio foi encontrada durante a reedificação da capela de Santo Ovídio e construção da escadaria na segunda metade do séc. XIX, não sendo conhecida a localização precisa do
achado. Em 1878 a estátua foi adquirida por Francisco Martins Sarmento, fazendo
actualmente parte das colecções do Museu da Casa de Martins Sarmento em
Guimarães, com o nº 93 do inventário.
O guerreiro de Santo Ovídio
foi talhado a partir de um único bloco de granito da região. Tem uma altura
máxima de 1.70 metros e a sua superfície apresenta vestígios de meteorização,
denunciando uma longa exposição aos factores naturais de erosão.
O corpo da estátua foi
encontrado partido sensivelmente a meio, sendo posteriormente colado com
cimento.
O modelo anatómico deste
guerreiro é comum no âmbito da estatuária indígena, que parece ter obedecido a
uma representação estereotipada.
O corpo apresenta uma posição
rígida, de sentinela, com os membros superiores estendidos na vertical, com a
mão direita segurando um punhal enquanto a mão esquerda segura na “caetra”,
observando-se vestígios de correias cruzadas no antebraço, para melhor prender
o pequeno escudo. Revela também robustez no tronco e mas pernas, que se
encontram partidas ao nível dos joelhos.
É usual esta estátuas,
aparecerem sem as cabeças. Isso deve-se ao facto de uma boa parte das cabeças
destes espécimes, serem esculpidas individualmente para depois serem colocadas
no corpo, através de um espigão possivelmente metálico. Parece ser este o caso
do guerreiro de Santo Ovídio.
“Sagum” (saio) – Liso, com
decote arredondado e manga curta, apresenta um sulco vertical bem vincado na
linha do externo, as costas são planas e de perfil bem cintado.
Cinturão – Apresenta três
toros paralelos e é decorado na parte posterior central com um florão de
suástica flamejante.
“Caetra” (escudo) – É redonda
e concava com umbo semiglobular em alto-relevo. Está também segura pela mão
esquerda, muito desgastada e com vestígios de correias cruzadas no antebraço.
Bainha do punhal - Apresenta
ponta circular e travessões
"Viriae" (braceletes) –
Representadas por dois e três toros, respectivamente, no braço direito e
esquerdo.
Fica aqui a singela descrição
de uma das principais peças do Património móvel deste concelho. Esperemos um
dia poder observar uma réplica deste guerreiro, no preconizado centro interpretativo do
Povoado Castrejo de Santo Ovídio, uma ambição que gostaríamos ver materializada.
Até lá, passe pelo Museu da Casa de Sarmento em Guimarães e aprecie esta
“nossa” estátua com mais de dois milénios.
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