2 de setembro de 2014

A INDÚSTRIA DA TRANÇA DE PALHA UM TESTEMUNHO DO INÍCIO DA SEGUNDA METADE DO SÉCULO XX





«É esta uma das indústrias mais características do concelho e, das pequenas industrias, talvez a que maior número de pessoas ocupa.
A trança é feita de colmo molhado, que se traz em molhos muito pequenos, debaixo do braço esquerdo. No mesmo braço dependura-se a trança, à medida que esta vai crescendo e, quando a porção já é suficiente, vende-se às braças, para freguesias onde se confeccionam chapéus, entre outras, Travassós – foco de actividade máxima -, Vinhós e Golães.

A confecção da trança parece uma brincadeira; um entretenimento proveitoso é-o, pelo menos, para algumas pessoas, porque, não exigindo grande ciência nem atenção, permite que nela trabalhe quem quer que seja, sem excluir crianças, mesmo dos dois sexos.





Destina-se sobretudo ao sexo fraco que, desde o levantar ao recolher, não dá repouso aos dedos.
Em algumas excursões que fiz, particularmente pelo norte e centro do concelho, quase não vi gente ociosa. Pelo contrário, as raparigas e velhas estão tão afeitas à trança, que só quase a largam para tomarem as refeições. 


 Ainda não tocou para a missa de fazer e já a ela estão agarradas. Nela vão trabalhando até à porta da igreja, onde provisoriamente a deixam, enquanto entram a rezar e, apenas saem, retomam a sua tarefa que não mais abandonam.
Isso não obsta a que se entreguem a outras ocupações. E é assim mesmo. Guardam ou conduzem gado, transportam fardos, cestos ou feixes de crótchas  ao mesmo tempo que entre os seus dedos fazem correr maquinalmente a trança. Outras vezes, a mãe faz-se acompanhar do seu filhinho mais novo, daquele que ainda não é capaz de a imitar neste trabalho, e leva-o até à fonte a vigiar o cântaro da água, para que o seu serviço renda e não tenha de ser interrompido.




Tem-se divulgado tanto esta indústria que o número de adeptos, sempre crescente, já se não confina apenas à parte setentrional do concelho, mas invade o centro em direcção ao sul. A gente nova prefere este modo de vida a todos os outros, porque, além de fácil, lhe permite conversar e deslocar-se pela aldeia, até à vila, sem prejuízo do rendimento do trabalho.  

Nas aldeias em que esta indústria está mais florescente, usam-se as «fazidas de trança», serões exclusivamente destinados a este serviço.
Nos dias de feira, acorrem a Fafe aldeãs de todos os pontos do concelho que aí vêm abastecer-se e vender, a par dos produtos das suas laboiras, enormes rimas de chapéus de palha. Nem ali afrouxam o seu trabalho, continuando a interminável faina da trança, enquanto atendem ou procuram convencer algum freguês.




O concelho, não só fornece todo o país, mas exporta também frequentemente, para o estrangeiro, grande quantidade desses chapéus.»


In: “Fafe – Contribuição para o Estudo da Linguagem, Etnografia e Folclore do Concelho”, Maria Palmira da Silva Pereira, Coimbra 1952.

Fotos colhidas no evento "Caminhos de Camilo" realizado em 24 de Março de 2012, no âmbito das III Jornadas Literárias de Fafe.

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