(MAIS ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS “IV
JORNADAS LITERÁRIAS DE FAFE”)
No
último número deste semanário foi publicado um artigo de opinião onde se apresentam
alguns juízos menos positivos relativamente ao projeto “Jornadas Literárias de
Fafe”. Partindo desse texto de Diogo Vasconcelos (aparentemente, o nome que dá
voz aos pensamentos expostos) gostaria de dizer que, ainda bem, não pensamos
todos da mesma forma. Aí está uma das riquezas da condição humana. Gostaria,
contudo, de tecer mais algumas considerações.
Num
primeiro momento, devo referir que o que aqui vou dizer apenas me compromete a
mim, enquanto pessoa. Não obstante, não seria totalmente honesto se não
dissesse que também me pronuncio com a propriedade de quem pertence à comissão
organizadora deste evento – que abracei de corpo e alma desde a primeira hora, em
março de 2010 –, mas igualmente de quem muito tem dado de si para que as coisas
possam ser aquilo a que todos têm tido oportunidade de assistir. De facto,
trata-se de um projeto coletivo que tem merecido a entrega e dedicação de uma
equipa multidisciplinar que não regateia meios nem esforços para elevar o nome
de Fafe, da sua cultura e das suas tradições ao nível a que muitos acham que
tem direito. A soma de tudo o que todos têm tido a vontade, a sorte e o engenho
de saber fazer é que tem dado a moldura a um projeto a que ninguém, hoje, em
Fafe, fica indiferente. E esta é a primeira vez que escrevo publicamente sobre
este assunto. Não porque não tenha muito para dizer mas porque procuro colocar
bom senso e sensatez em tudo o que faço e sobretudo porque entendo que quando
existem responsabilidades assumidas, falar demais, pode não acrescentar nada de
novo, mas antes pelo contrário criar potenciais focos de dispersão
perfeitamente desnecessários. Também sei falar por metáforas, se assim o
entender, mas defendo que as coisas se devem dizer às pessoas certas e no
momento certo. É assim que eu sou. Agora, também me parece que anda por aí
muito jornalista, articulista, comentarista e outros que, ou são daltónicos ou
não estão a ver bem. É pena, porque alguns são de facto opinionmakers locais…
Quanto
ao Diogo Vasconcelos, a verdade é que me parece que anda um pouco desinformado
da realidade do que verdadeiramente tem sido o projeto “Jornadas Literárias”. A
organização não promoveu apenas vinte e cinco eventos, não senhor! Do dia 19 ao
dia 28 de maio foram desenvolvidos, por todo o concelho, cento e vinte e mais
alguns eventos, nas escolas, nas livrarias, nas bibliotecas, nas associações, e
nas diversas e algumas belíssimas salas de espetáculos que Fafe tem, e, na sua
quase totalidade ligados à componente literária. Estamo-nos a referir a
lançamentos e apresentações de livros, palestras, sessões de leitura e
declamação e poesia (algumas em línguas estrangeiras), olimpíadas da leitura,
dramatizações, peças de teatro (até em língua inglesa), exposições, encontros
com escritores, construção de textos individuais e colectivos e até de peças de
teatro, workshops, feiras de livros, lançamentos
de revistas, pesquisas (obras, textos, autores, lendas, …), explorações de
obras literárias, celebração do Dia Mundial do Livro,… Mas estamo-nos
igualmente a referir aos autores tratados e que vão desde o Ubaldo Ribeiro (que
muito fizemos para trazer a Fafe e que por motivos de idade e de saúde não se
pode deslocar a Portugal, como estava previsto), mas também a Luís de Camões, Gil
Vicente, João Manuel Ribeiro, João Tordo, Julie Hodgson, Papiniano Carlos,
Richard Towers, Maria Isabel Pinto Bastos, Joaquim Barbosa, …, e todos os outros
da nossa praça, esses já mais conhecidos para muitos de nós . Associar o
projeto a um fim de semana (a todos os títulos memorável, no mínimo), e sobre o
qual nos iremos já pronunciar, é, no mínimo redutor. Parece-nos que foi esta a
perspetiva do Diogo Vasconcelos.
Agora, o projeto “Jornadas Literárias de Fafe”
é um projeto cultural, sem qualquer dúvida! E a verdade é que esta também tem
sido a discussão no seio da comissão organizadora. Mas é, pelo menos até hoje, comprovadamente
um projeto cultural ligado a uma matriz literária muito acentuada. E disso, a
comissão não tem dúvidas. Até o grandioso evento inaugural “Mala de Cartão”
tinha uma história representada que atava
todas as pontas e à volta da qual se contextualizam todas as coreografias
representadas em palco. Foi assim neste espetáculo como em todos os outros
apresentados ao público nas versões anteriores. Agora, é preciso estar atento! E,
quanto ao futuro… logo se vê!
Mas
o que me traz a esta exposição não é a discussão legítima à volta de opiniões
diferentes. Essa é positiva, como disse! Considero-me filho de gente boa, e disso
não tenho a menor dúvida, e como filho de gente boa, também acredito que
verdadeiramente “só não se sente quem não é filho de boa gente”. Escrevia o
Diogo Vasconcelos, com enorme propriedade (!), que “As Jornadas, que poderiam
ser para Fafe um momento de forte afirmação cultural, revelam-se na verdade,
modelo de perfeito provincianismo”, acrescentando o lamento pelo apoio a
“iniciativas deste género”. Com enorme orgulho, sou provinciano, sim!
Provinciano no sentido em que sinto perfeitamente identificado com muitas
coisas boas que existem nas aldeias e que se têm vindo a perder nesta sociedade
que não olha a meios para atingir fins; provinciano no sentido em que me
preocupo com o bem-estar do meu vizinho, no sentido do apoio ao próximo, no
sentido da partilha, enfim… no sentido em que vivo numa aldeia de nome Fafe.
Mas considero-me um provinciano viajado e cosmopolita! Não sou provinciano no
sentido que o Diogo lhe quer dar. Esse sentido, meu amigo, esse sentido é
pejorativo; esse sentido é mau e a verdade é que essa crítica é, no mínimo,
muito mas mesmo muito infeliz. O que aconteceu no fim de semana “Fafe dos
Brasileiros” é tudo menos ridículo ou ingénuo e muito menos merece escárnio. Provinciano
é aceitar tudo o que vem de lá de fora como excelente e ter vergonha do que
verdadeiramente se é! Provinciano é pensar que ser moderno é renegar as raízes
e não assumir aquilo que somos!
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Enfim,
o que eu pretendo deixar claro é que, queiramos ou não, parte da riqueza
cultural de Fafe reside naquilo que se viu ao longo das Jornadas Literárias e
principalmente desse grandioso evento do fim de semana de 26, 27 e 28 de maio. Não,
não sou dos que pensam que a cultura produzida em Fafe se esgota aí! Mas a verdade
é que a qualidade de muitas das manifestações apresentadas superou, de longe, o
que aconteceu na edição anterior das Jornadas. Temos grupos, que, e desde que
devidamente apoiados, são capazes de produzir espetáculos do mais erudito que
há. Neste sentido da versatilidade cultural, até acho que Fafe é uma cidade
moderna. Haja oportunidades! Agora a cultura não tem que ser compartimentarizada,
obrigatoriamente, de forma estanque. Quanto à mostra etnográfica “A memória e a
gente” propriamente dita, nela foram retratados temas muito caros à população
do nosso concelho: a memória operária, a lenda do Penedo de Penouta, o ciclo do
azeite e do vinho, o circuito da lã, da madeira e da palha, o fabrico das
tachas e a sua importância na economia do início do século, …. Riquíssimo,
convenhamos! Está claro que não foi apenas povo a divertir-se. Foi a alma desse
povo que, de forma genuína, logo autêntica, veio mostrar o que é ser de Fafe e
o que de bom existe em Fafe…, o verdadeiro património de Fafe. Pobreza, meu
amigo, não está nas recriações apresentadas mas na leitura que delas
conseguimos retirar.
E a
verdade é que, entre nós, organização, existe a perceção de que este projeto
poderia ter muito para dar a Fafe… Houvesse entendimento por parte de muitas
entidades competentes para que tal pudesse acontecer! Sem receios de mexer, de procurar,
de ouvir, de trabalhar, de partilhar, de apreciar, de construir e reconstruir,
caso fosse necessário. “Fafe dos Brasileiros” tem estas potencialidades
culturais mas igualmente turísticas e até económicas. Claro está que não é um
grupo de amigos, que por muita boa vontade que possam ter, consegue este feito!
Seria necessário um trabalho muito mais abrangente, profícuo e até
profissional, envolvendo as tais partes que, com propriedade, têm voto na
matéria. E a verdade é que estas partes têm rostos. Refiro-me às instituições e
coletividades culturais mais representativas do concelho, aos museus, às
escolas interessadas, à

E,
para concluir, quanto à ideia surreal de fechar os professores nas escolas
(secundárias ou outras), ainda bem que a cultura não é propriedade de ninguém
nem de nenhum cargo. Não fosse alguém comprá-la toda e não sobrava nada para os
outros.
Paulo
Teixeira
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