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O povo aguarda a chegada da Senhora de Antime no centro da vila Fotogravura do principio do séc. XX |
«SENHORA d’ANTIME
É uma romagem de máxima nomeada no concelho de Fafe e na
parte oriental inteira do distrito de Braga. Chama-se-lhe também romaria da
Senhora do Sol e romaria da Senhora da Misericórdia, em virtude do fervor das
suplicas e do intenso da fé com que os povos se endereçam a esta Senhora, nas
faltas de chuvas ou de sol.
A imagem da Virgem é de pedra fina (granito metamórfico)
com braços postiços e sem pés nem pernas, nem feitio algum de estatuária, além
do rosto unicamente. Tem oito arrobas de peso e está colocada em um tosco andor
antigo de oito arrobas também, a que dão o nome de charola da Senhora.
Dá a tradição por aparecida esta imagem no Monte de S.
Jorge, entre Fafe e Cepães, e entre a freguesia de Antime igualmente; monte de
uma boa légua de comprido e meia légua de largo, onde abundam grandes pedreiras
de pedra fina (granitos metamórficos especialmente), d’envolta com granitos efusivos
duríssimos, entre os quais aparecem, às vezes, belos granitos porfiroides;
granitos explorados todos incessantemente e os metamórficos sobretudo, para as
construções nas vizinhanças de Fafe em redondo, até uma légua às vezes.
Também neste mesmo monte «S. Jorge Magno», venera o povo o
penedo da pegadinha, em comemoração da crença que tem, das pegadinhas que no
dito penedo deixara impressas o jumentinho da Senhora, indo ela uma vez a
cavalo por estes sítios.
Celebra-se a função da Senhora de Antime, com vésperas, no
2º domingo de Julho, na sua freguesia reitoral de Santa Maria do mesmo nome, a
um quarto de légua para o sul da vila de Fafe; fazendo-se pela manhã o
aniversário das almas, com seu sermão apropriado à festa. No domingo de manhã,
por volta das 10 horas, sai de Antime para a igreja de Fafe a procissão da
Senhora, fazendo-se então nesta igreja matriz exposição do Sacramento, com sua
missa cantada, e o competente sermão, e por volta das 6 horas da tarde regressa
para a respectiva freguesia, no meio de numerosíssimo concurso de romeiros,
como na sida de Antime para Fafe.
Era outrora ainda mais galhofeira do que hoje, esta romagem
de Antime: chegava quase a delírio o afervorado das salvas da companhia de
mosqueteiros da procissão, não só na saída dela e na volta dela mas sobretudo
no acometimento de um castelo fictício, de propósito erigido para dar mais
realce à função e para a tornar mais estrepitosa; o castelo a final tomado era
abrasado em chamas pelos mesmos mosqueteiros, depois de fingido um aparatoso
conflito de sitiantes e sitiados, e vencido a final o Rei mouro acastelado.
Dá a tradição por origem desta fingida peleja, muito
victoriada dos romeiros em chusma, a comemoração de antigos feitos dos povos da
localidade na expulsão dos mouros, quando era senhor e povoador de Fafe, nos
primeiros tempos da nossa independência, D. Egas Fafes, filho aguerrido do
aguerrido D. Fafes Luz, alferes do Conde D. Henrique, primitivo tronco
genealógico da nossa dinastia afonsina.
No meio das folias e extravagâncias da romaria, têm ficado
algumas vezes esmagados alguns dos condutores da charola debaixo do seu
excessivo peso. Costumam ser 16 em geral, para pegarem revezados aos oito
braços, ou banzos da dita charola da Senhora, os valentões da procissão,
valentões que se oferecem com antecipação de um ou dois anos às vezes, e que
não conseguem esta graça especial dos mesários da Senhora, senão a poder de súplicas,
empenhos e solicitações.
Não é todavia a mera ostentação de forças e de robustez de
corpo a que assim faz deprecar a graça de carregar com os banzos da charola aos
ombros. É especialmente porque têm para si os mancebos da localidade (Fafe e
Antime sobretudo) não serem bem-sucedidos nos seus casamentos se não pegarem
primeiro ao andor da Senhora. Nessa ocasião, para eles da maior expansão de
coração juvenil, costumam colocar esses mancebos dos banzos os seus ramos de perpétuas
na charola, aos quais se dá o nome sacramental de pinhas da Senhora de Antime.»
J.J. da S. Pereira Caldas (Braga)
Transcrito (com alteração ortográfica) do:
“ALMANACH DE LEMBRANÇAS LUSO-BRAZILEIRO” de 1859
Por: Alexandre Magno de Castilho
Lisboa, Imprensa Nacional, 1858
Páginas 274 e 275
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