20 de outubro de 2020

EFEMÉRIDE 1º JOGO NO PARQUE DE DESPORTOS FOI HÁ 52 ANOS


Em domingo, 20 de Outubro de 1968, com campo e bancadas provisórias, a Associação Desportiva de Fafe recebeu o Clube Oriental de Lisboa para disputar o primeiro encontro de futebol no recém-terraplanado retângulo de jogo de um Parque Desportivo em construção.

Um desafio a contar para a primeira eliminatória da Taça de Portugal, com a A.D. Fafe a vencer por 2-0, resultado que entusiasmou, ainda mais, um número elevado de espectadores.

Lembre-se que, em reunião do executivo camarário realizada em 8 de Outubro de 1968, foi ratificada a aquisição de 29.620 metros quadrados, pelo valor total de 95.675$00, destinado à construção do Parque Municipal de Desportos de Fafe.

Imagem: reprodução do jornal “Notícias de Fafe”, 1972


 

18 de outubro de 2020

EFEMÉRIDE - Doação da Igreja de Santa Eulália Antiga

 



18 de Outubro de 1360

A propósito do 660º aniversário  da doação da igreja de Santa Eulália Antiga ao Mosteiro de Santa Marinha da Costa de Guimarães, deixamos aqui uma breve nota.

O Rei de Portugal e Algarve, D. Pedro I, herdeiro da igreja paroquial de Santa Eulália Antiga, através de uma carta régia emitida na cidade do Porto em 18 de Outubro de 1360, fez a doação  do padroado da referida igreja ao Mosteiro de Santa Marinha da Costa, à época, nas mãos dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, que, assim, ficaram com todos os privilégios da referida igreja, incluindo todas as suas propriedades urbanas e rurais.

Em contra partida à doação, D. Pedro I exigiu que,  na Igreja do Mosteiro de Santa Marinha da Costa, fossem cantadas duas missas em cada dia, uma pelo Rei e outra por alma de D. Inês de Castro, sua mulher.

Sabe-se que no século XVIII, os Monges de São Jerónimo, detentores do Mosteiro da Costa desde 1528, vinham a Fafe cuidar das suas terras, hospedando-se em um «imponente» edifício que existiu nas proximidades da Igreja Matriz. Seria no local onde existe a Casa da Paróquia de Santa Eulália?

Com a expulsão das Ordens Religiosas em Portugal, no ano de 1834, o Padroado da igreja de Fafe passou para as mãos do Arcebispado de Braga, onde se mantém.

Jesus Martinho

 

 

 

 


10 de setembro de 2020

PRIMEIRO CARRO DE ALUGUER CHEGOU HÁ 111 ANOS


 

No sábado, 6 de Fevereiro de 1909, chegou à “Garage Fafense” o primeiro automóvel de aluguer com a lotação de 7 lugares.

O preço dos fretes variava entre 140 e 200 réis por quilómetro.

A “Garage Fafense” localizava-se na Rua do Príncipe Real, correspondente, grosso modo, à artéria que atravessa a actual Praça 25 de Abril.

Começou assim, na antiga Vila de Fafe, a era do transporte automóvel que durante muitos anos coexistiu com os tradicionais coches de tracção animal.




9 de setembro de 2020

FIGURAS DO TEMPO DE RUY MONTE (1902 – 1986)


Praça da Republica e Avenida 5 de Outubro nos anos 20 do século passado
 

ALBINO SILVA


Nesse tempo – vai para 50 anos – ainda não havia Secretaria Judicial e os cartórios dos escrivães-notáveis espalhavam-se pela vila, em edifícios particulares.

Estou a ver o do Dourado, ali no Largo e o do Albino Leite Silva, nos baixos do Clube Fafense, à esquina que deita para a loja do saudoso Bernardino Monteiro, hoje do meu amigo Antoninho das Lobas.

O Dourado, pausado no andar e delicado no trato, era uma verdadeira figura de aristocrata e conservador, no físico e no moral.

Albino Leite da Silva era o retrato vivo do republicano irreverente e democrático dessa época. O físico, o rosto irregular e anguloso, olhos muito vivos e boca escancarada num sorriso sempre sardónico, convidava à discussão e à anedota.

Eram ambos duas figuras típicas e de destaque da nossa terra.



Embora sem o título de Dr., hoje um pouco desacreditado em medíocres sem conta, Albino Leite não era nada troixa, tinha uma razoável cultura de autodidacta e nascera para jornalista.

Fundara-se, na nossa vila, por esse tempo, um belo jornal do Partido Republicano Português, a “Democracia, uma das publicações semanais fafenses mais bem feitas de todos os tempos.

O artigo de fundo costumava ser sensato e pensado. A polémica política e religiosa era desabrida e, por vezes, temperamental. Mas os soltos da crítica e do dia-a-dia brilhavam pela graça, malícia e manha.

Pois Albino Leite passava por ser (e era-o de facto), o redactor mais fecundo e feliz.

Onde estivesse, borbotava a anedota e explodia a gargalhada.

Era, por isso, muito procurada a sua companhia.



Um dia, certo mister, inglês endinheirado, procurou-o no cartório, para cicerone duma visita à nossa vila,

- All right, My Lord, com todo o gosto.

Deixando o cartório entregue àquele simpático moço, que todos nós conhecíamos e estimávamos, o Moura de Silvares, lá partiram os dois.

O roteiro começou, naturalmente, pelo jardim do Calvário.

Mister ter gostado muito e ter feito questão de andar de barco.

- Que pena não ser maior, para poder fazer regatas Fafe!

Albino Leite gozava como um preto e comungava, com muitos «pois» e acenos de cabeça, nas críticas e impressões do Beef.

A Rua de Baixo cheirou-lhe mal. O Retiro escandalizou-o. Revoltou-se com a igreja nova incompleta. E abriu, a boca diante da Fábrica do Ferro, que julgou só poder existir na Inglaterra.



Checaram finalmente ao nosso Hospital.

Recebeu-os o Dr. Álvaro Pinto, no seu à-vontade característico.

Mister cumprimentou os doentes, quis apalpar as camas e provou a sopa do dia.

Entraram depois na capela.

Uma bela imagem de Nossa Senhora, ainda lá estava à tempos, velando os que sofrem.

Perguntou o inglês:

- Quem ser esta senhora?

- É a virgem Maria, esposa de S. José e mãe de Cristo – correu a informar o cicerone, muito sério.

Cumprimentou-a com uma vénia e rodaram para a cadeia velha, que ficava, como sabem, em frente.

Não gostou da sua falta de higiene, mas ficou chocado com a rica escultura de S. José que dominava a capela.

- Que ser este cavalheiro?

- Este é o marido daquela senhora que está no Hospital.

- Belo homem… mas ser mais velho que a senhora!

- Era mais velho, era… mas davam-se bem – comentou o cicerone.

Minutos depois, deram entrada no nosso cemitério. Achou-o muito limpo, bem situado e algo tanto monumental.

Visitaram a capela. Ao fundo, um grande Cristo ainda hoje agoniza e morre crucificado.

Nova pergunta do Mister:

- E quem ser este pobre homem?

Acode logo Albino Leite:

- Este é o filho daquela mãe que vimos no Hospital e daquele pai que está na cadeia.

O inglês murmurou, sinceramente:

- Pobre família!

Albino Leite, zombeteiro e um tanto ateu, como então era moda, não pôde deixar de concordar:

- Realmente, realmente… a mãe no Hospital, o pai na Cadeia e o filho no Cemitério…

Pobre família!

O inglês concluiu, muito pesaroso:

- Dizer bem, dizer bem, senhor Albina. Pobre família!

E foram desafogar a mágoa, com cerveja, no café do Álvaro Figurão.


RUY MONTE

In jornal “Justiça de Fafe”, nº 117, 7 de Dezembro de 1978.



NOTA: Os acontecimentos relatados nesta crónica remontam, grosso modo, ao ano de 1928. Teria Laurentino Alves Monteiro (Ruy Monte), 26 anos de idade.


7 de setembro de 2020

MANUEL JOAQUIM LOPES QUEIJO Um homicida do século XIX natural de Vila Cova






Imagem  ficcionada para ilustração



Em 1814, na freguesia de Vila Cova, Anna Maria Lopes deu à luz um filho gerado por António Joaquim Queijo, homem de má reputação, que haveria de transformar o seu primogénito, Manuel Joaquim Lopes Queijo, em um dos mais temerários bandidos da região.
Desde cedo, com a cumplicidade de seu pai, o jovem Manuel preteriu a sua profissão de sapateiro para enveredar pelo caminho do banditismo, cometendo os mais diversos crimes: roubou, extorquiu, ameaçou, feriu e matou pessoas indefesas da região.

Ele era o terror dos povos de Basto, pois chegava a qualquer e lhe dizia – Sr. Fulano, a mim dão-me 6 moedas para o matar, e eu não as posso perder, que tenho mulher e filhos – E não havia remédio senão dar-lhe as 6 moedas, com seus devidos agradecimentos!”


Com 24 anos de idade, em 1838, Manuel Queijo acumulava inúmeros crimes, entre os quais dois homicídios.
Com a “cabeça a prémio”, o sapateiro salteador acabou por ser capturado e entregue ao implacável poder judicial do século XIX.
Ao tempo da prisão, Queijo tinha residência no lugar da Boucinha, freguesia de Arnóia, Julgado de Celorico de Basto, Comarca de Fafe.




Antiga Cadeia da Relação do Porto
Reprodução de postal ilustrado em inícios do Sec. XX 


Em 6 de Junho de 1838, respondeu perante o Juízo Criminal no Julgado de Celorico de Basto, presidido pelo Juiz de Direito da Comarca de Fafe.
Acusado pelo Ministério Público, foram provados os crimes seguintes:

- Ferimento de Manuel Matheus, na noite de 18 de Março de 1836.
- Morte do proprietário octogenário, Manuel Joaquim da Motta, da Quinta do Alvão, na noite de 15 para 16 de Dezembro de 1836.
- Morte do tendeiro, António Teixeira, na freguesia de Pinheiro, em 9 de Junho de 1837.
- Ameaças com armas e extorsões de dinheiro.

A Manuel Lopes Queijo foi-lhe aplicada a pena capital, morte por enforcamento.
Apesar de “reclamar” para a Relação do Porto, a sentença foi-lhe confirmada em acórdão datado de 15 de Novembro de 1839.
Não satisfeito, Queijo recorreu ao Supremo Tribunal que manteve a sentença, após ouvir o Concelho de Ministros.
O jovem homicida tinha os dias contados. Seria enforcado em praça pública na Vila de Freixieiro de Basto.

As autoridades providenciaram, sem demoras, o complexo aparato para a execução do condenado Lopes Queijo.
O periódico “O ECCO”, fonte única deste trabalho, relata os acontecimentos ao pormenor:

“…O Ministério Público julgou que a clemencia da Soberana não deveria ter lugar e S. M. não usou do Poder Moderador, e, confirmando a sentença a mandou executar, e foi para este fim que tinham chegado no Vapor Vezuvio os 2 carrascos, Simões e Ramos.
Estavam todas as medidas tomadas para a execução ter lugar na freguesia de Freixieiro de Basto, e já o Regimento 18 tinha saído de Guimarães para o lugar da execução, e de Braga 105 homens do 15. E quando parecia que todos os recursos estavam esgotados é que aparece um Poder novo, e que o homem é salvo!
Às duas horas da noite se apresenta nas Cadeias da Relação o Capitão J.M. de Cavalaria 6, comandante da força que deveria acompanhar o réu ao lugar da execução. Chegaram depois destacamentos de 18, de Artilharia, de Cavalaria, além da guarda principal, que era de 28. Parece que toda a força seria de 60 praças. O Capitão é chamado ao escritório do Carcereiro para passar o recibo, ele passou, não só do réu como dos dois algozes, e com este recibo terminou a responsabilidade do Carcereiro, que fez entrega dos 3 [homens].
Todos 3 estavam soltos, o Capitão obrigou o Oficial de Diligencias a algemar os 2 algozes, e querendo que o réu fosse algemado, diz-se que o dito Oficial de diligências respondera, lá em baixo será algemado depois de montado!
Seja porem como for, é certo que ele desceu solto, e, no meio de uma escolta, é que chegando à loja, enquanto lhe preparavam os arreios da cavalgadura, tendo-lhe sua mulher falado ao ouvido, ele deu dois pulos, lança por terra um soldado, e foge pela porta fora, à vista da força que ali estava postada!
Consta que toda ou parte da força correu em cima dele, sendo ainda escuro o perderam de vista!!
O Capitão correu logo à ponte, e dizendo-lhe o vigia que nenhum homem ali tinha passado, deu ordens para ser preso todo que ali passasse. As mais exactas ordens foram dadas logo às patrulhas Municipais que andavam rondando. Tudo isto e o mais que se fez foi inútil pois o réu sumiu-se perfeitamente, e não há uma só testemunha que visse a direcção que ele levou. O réu foi mais hábil em prestigios que Mr. Leroux. “
Esta alegada inabilidade das forças responsáveis pela transladação de Manuel Queijo provocou reacções diversas na opinião pública portuense.
Enquanto uns criticavam negativamente a competência das autoridades implicadas, outros acharam que o réu estava no seu direito de tentar fugir à morte agendada.
“Consta geralmente, nesta cidade, que o réu, no momento da fuga se dirigiu pela rua das Taipas abaixo, atravessara a rua de S. Miguel, com intenção de se dirigir pelas escadas da Esmoga, porem sentindo passos, saltou para um quintal que há junto da igreja da Victória. E ali estivera todo esse dia e noite, e dali se dirigiu ao Carregal, onde dormiu duas noites”.

A fuga do condenado Manuel Queijo não durou muito tempo. Ao fim de escassos dias, foi recapturado pela Polícia de S. Clemente de Basto, no lugar de Gandarela, disfarçado, fazendo-se acompanhar de um almocreve.
O réu entrou na cadeia de Basto, às 2 horas, do dia 3 de Julho de 1840.
Aproximava-se, a passos largos, o fim da vida de Manuel Joaquim Lopes Queijo, um homem de estatura normal, rosto comprido, olhos castanhos, cabelo e barba preto.
Um jovem de 26 anos que espalhou o mal, acabando por sofrer a mão dura de uma justiça ainda com fortes reminiscências medievais, que não tinha pudor em torturar quem magoasse e matar quem tivesse assassinado.





Aspecto da freguesia de Freixieiro de Basto, onde teve lugar a execução
Gravura do século XIX "O Minho Pittoresco)


O DISCURSO DO CONDENADO

Pouco antes de subir à forca, António Queijo pediu a presença do escrivão Domingos Marinho da Silva, e, pelo seu punho, escreveu as suas últimas palavras que proferiu, em voz alta, sentado no último degrau da escada do patíbulo da morte:

“Meus Senhores!
É chegado o triste momento em que meus crimes vão ser castigados com a minha própria vida, neste patíbulo, recompensa bem justa de meus execrandos atentados. Sabei pois todos que foi a causa de tudo isto a má educação e mau exemplo que meu pai me deu, assim como as más companhias a que me juntei.
Se meus pais me dessem a devida educação, e não me poupassem o castigo que tantas vezes merecia, eu não chegava a ser bombeado nesta forca, na curta idade de 26 anos.
Olhai, olhai para mim, irmãos meus, e vós pais de famílias, abraçai este triste exemplo para que de hoje em diante deis educação a vossos filhos.
Nunca poupeis o devido castigo.
A execução da minha morte tem sido causa de se derramar muitas despesas no concelho, por isso, peço perdão pelo amor de Deus a todos os habitantes deste concelho. Peço perdão às autoridades pelo trabalho que tiveram; à tropa, pela fadiga das suas jornadas, aos padres que com tanto zelo ganharam a minha alma para Deus, e, sobretudo, peço perdão a Manuel Joaquim da Motta do Bau, a quem por acaso matei. Por isso não imputem esta morte a seu filho Francisco, nem a sua mulher, pois que nenhuma parte nela tivera… só eu fui o culpado.
Finalmente, rogo a todos que se acham presentes, que rezem um Padre Nosso à morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, para que me dê a sua graça e força para sofrer com paciência esta morte.
Além disto me lembro que fiz outra morte, e por isso peço perdão a todos os parentes daquele que eu matei.
Com a minha vida, causei muitos escândalos e por isso peço perdão a todos a quem ofendi, e de todos os roubos que fiz, era minha vontade pagar, mas não posso, peço perdão.
Finalmente perdoai-me senhores, perdoai-me todos e rezai à Virgem Nossa Senhora uma Salve Rainha, para que me acuda nesta hora, e, se puderdes, ouvir pela minha alma uma missinha, Deus vos corresponderá.”

Manuel Joaquim Lopes Queijo



Até 1846 estes "espectáculos" eram frequentes nos centros de vilas e cidades de Portugal



Na Praça de Freixieiro, ao início da tarde de 11 de Julho de 1840, perante uma multidão “silenciosa e recatada”, calculada em cerca de 3.000 pessoas, do Concelho de Celorico de Basto e terras vizinhas, Manuel Joaquim Lopes Queijo foi enforcado, decapitado, ficando a cabeça exposta num pau espetado no solo.

Haveriam de passar alguns anos até ser feita a ultima execução em Portugal, que teve lugar em Lagos, no dia 22 de Abril de 1846.
A pena de morte, em território português, para crimes civis, foi finalmente abolida em 1 de Julho de 1867, durante o reinado de D. Luis.
O Código de Justiça Militar, em Portugal, manteve a pena capital até 1976, passados dois anos da “Revolução dos Cravos”.

Jesus Martinho 

FONTE: “O ECCO”, Jornal Critico, Literario e Politico

Nota: As transcrições foram adaptadas na grafia e na pontuação.

6 de setembro de 2020

O OPÍPARO BANQUETE DA INAUGURAÇÃO DO COMBOIO DE FAFE


A Casa do Santo Novo onde foi servido o jantar aos convidados
da inauguração do comboio de Fafe

Após a chegada do primeiro comboio a Fafe, na manhã do dia 21 de Julho de 1907, num dos maiores acontecimentos da história contemporânea local, não poderia faltar um faustoso manjar para os convidados “VIP”. Partilho aqui o distinto menu do jantar comemorativo da inauguração da linha férrea Guimarães-Fafe.

 

JANTAR

«Na nobre casa do Santo, fidalgamente cedida á ilustre commissão dos festejos, foi offerecido, pelas 5 horas da tarde, á direcção e pessoal superior da companhia e a diversos cavalheiros convidados, um opíparo banquete, cujo menu, fornecido pela confeitaria Oliveira, do Porto, foi assim constituído:

Potage creme a la ville de Fafe.

Petits vol-au-vents de Perdreaux aux truffes,

Turbot sauce aux capers,

Piece de boeuf au champignons,

Mayounaise de homard a la modernne,

Galantine de carnad a la Paaurcenne,

Diudonneaux Roti au cresson,

 

DESSÉRT

Panding a la Portugaise,

Glace a la creme et aux fraises,

Selade de fruits au champagne,

Gelée au liquer d’or,

Charlotte Russe a la Chantilly,

Fromage et friuts divers,

Patisserie assorties.

 

VINS

Xeréz, Madére, Collares, Blanc et Rouge, vert Fafé, Básto, champagne, Porto secco, café, cognac et liquers».

 

Ao dessert, o snr. conselheiro Florencio Monteiro, dr. João Leite de Castro, Luiz Dourado, Oliveira Guimarães, Antonio Caldeira e outros brindaram a el-rei, a Reis Porto, a Ferreira de Lima, ao concelho de Fafe, ás damas e á imprensa, terminando o opíparo banquete, em que sempre reinou alegria, pelas 8 e meia da noite, hora a que já nas ruas, havia um extraordinário movimento de gente anhelante de ver as illuminações que pela sua originalidade e bom gosto, eram d’um effeito deslumbrante, feérico, único.

 

A’s 9 horas começou a queimar-se o fogo de artificio que agradou muito, e ás 10, oprefixas entre as acclamações enthusiasticas do povo, ao som da musica e do troar da dynamite, regressou a Guimarães o comboio inaugural.

Na villa, porem, continuaram os festejos, que se prolongaram até deshoras da noite, mantendo-se o povo a apreciar as illuminações, que, como dissemos, eram d’um lindo effeito, d’um brilhantismo raro.»

 

In jornal “O Povo de Fafe”, 25 de Junho 1907

 


 

29 de agosto de 2020

A SANTINHA DE FAFE Uma figura do tempo de Ruy Monte

Reprodução do jornal, "Justiça de Fafe",  “Justiça de Fafe”,  21 de Dezembro de 1978

A Santinha de Fafe

«Onde isso vai!

Onde vai já a minha fé de criança!

Acreditava em tudo… Até acreditava nos homens!...

Hoje nem em mim acredito!

Os santos e os médicos julgava-os então parceiros ou sócios (mas não concorrentes desleais), a curar os nossos achaques e os nossos males.

E, com a mesma fé, comprava óculo para a vista e fazia promessas a S.ta Luzia.

Que feliz eu era então!

- Que era ingénuo… que era um simplório… que não raciocinava… que era talvez um lorpa – direis vós.

Pois era, meus amigos, pois era… mas, nesse mundo de fantasmas, santinhos e bruxas, eu sonhava, eu não sofria os tormentos da dúvida… eu era feliz, como uma criança, no reino dos seus brinquedos.

Que me deram a vida e a ciência em troca?

- Um presente de desilusões e cepticismo… e um futuro de desesperos e aniquilação.

Ora bolas para a troca…

 

 

Vem isto a propósito da Santinha de Fafe.

Conhecem-na?

Conhecia-a eu muito bem, nas minhas idas e vindas, da Escola de Castilhão, com o meu bibe ao vento, a sacola aos ombros e 8 anos de saúde de ferro e estômago de avestruz.

Aquele seu quartito todo branco, como aquela alminha de Deus toda branca, brancas as roupas, branco o rosto e as mãos, branco o tecto… e, no meio daquela brancu7ra toda, uma frescura imaculada, um sorriso que parecia do céu e uns olhos vivos e irresistíveis que nos chamavam, daquela cama de sofrimento, como um íman a que ninguém fugia.

E todos lhe perguntávamos, eu e os meus companheiros, e toda a gente afinal, suspensos das suas palavras, que também pareciam imaculadas e brancas:

-A santinha ainda não comeu hoje?

A resposta, a sorrir, era sempre a mesma:

Pois não, meus meninos.

Eu não como nem bebo.

E eu mais atrevido:

- Então também não faz chi-chi – nem có-có?

- Pois não, meus anjinhos.

Ela mergulhava nas suas orações brancas… e nós ficávamos em êxtase, no sétimo céu da inocência feliz.

 

Nessa idade, era eu um diabrete de tal força que apanhava seis tareias, por dia: três na aula e três em casa!

A minha santa mãe, que Deus haja, já desesperada, lembrou-se de pedir um milagre à santinha.

Certo dia, lá fomos os dois.

Minha mãe falou-lhe ao ouvido… e ela sorriu.

Que si… que sim. Que sossegasse a senhora Mariquinhas, que ela me ia tomar à sua conta.

E começou a rezar o seu tercinho branco, diante de nós…

 

Não levou muito tempo que minha mãe acreditasse no milagre. Comecei a apanhar só uma vez por dia!

E mais ainda se convenceu, quando aos 12 anos, despertou em mim o desejo de ser padre, desejo que veio dela certamente e durou nada menos de 10 anos de sonho.

O pior foi que a Santinha morreu.

Surgiu, na minha vida de homem feito, outra santa… menos branca talvez… mas mais irresistível.

E lá foi a minha vocação para as malvas…

Mas quem me dera que o tempo voltasse para trás, que a Santinha ressuscitasse e voltasse àquele quartinho branco! Que eu, de novo estreasse um bibe ao vento e partisse a cachola aos meus companheiros! E que minha mãe tornasse a acreditar nos milagres!

Mesmo que voltasse às seis tareias por dia…»


Por Ruy Monte

In: jornal “Justiça de Fafe”, nº 118, 21 de Dezembro de 1978

O episódio da "santinha de Fafe" aqui relatado remonta a c. de 1910.


 

«Frente ao nº 9 da Rua da Seara, em Fafe, param
amiudamente autos luxuosos e deles se apeiam 
senhoras e creanças, vindas das cidades, para consultar a «santinha»
 
Reprodução da revista "Ilustração", nº 44, Lisboa, 16 de Outubro de 1927.



 

28 de agosto de 2020

SENHORA DAS NEVES A LENDA NO SÉCULO XVIII

Painel oitocentista no Santuário da Senhora das Neves de Lagoa, Aboim

 

A Lenda da Senhora das Neves publicada em 1712 

«É esta Santa Imagem multo antiga, causa porque de sua origem se não sabe nada com certeza, assim do seu aparecimento, como da forma dele mas a tradição, que sempre tem muita força conservada entre a gente daquelas partes, é, que aparecera em aquela mesma serra a uma inocente pastorinha, a qual guardando algumas poucas ovelhas naquele monte a descobrira, & dizem que em hum dia de muita neve, sobre uma árvore a que chamam naquelas partes “Esqualeyro”. Alegre a pastorinha com o achado tesouro, tomou a Santa Imagem da Senhora, e com a sua singeleza a meteu no cabaz, em que costumava recolher o pão, e as massarocas. Com esta rica jóia se recolheu a casa muito alegre, e chamava à Senhora a sua Santinha, e lhe ia fazendo muita festa. Naquela noite sonhou que a Senhora lhe dizia, que no mesmo lugar em que a descobrira, se havia de fazer uma Casa, em que fosse venerada. Despertou com este cuidado, e indo a buscar a Senhora ao cofre das suas jóias, que era a cesta das suas massarocas, a não achou, de que ficou sentidíssima. Para alívio da sua saudade a foi buscar ao monte em o seu costumado exercício, toda sentida, e lacrimosa, de que se pagou muito a Mãe de Deus; porque não só pela sua Imagem, mas ela mesma se dignou de a consolar, dizendo-lhe, Não chores, que cedo me verás todos os dias.

Isto é o que referem os moradores daquele lugar sobre o aparecimento da Senhora, e não sabem dizer mais nada. Poderá bem ser, que a capacidade, pastorinha referisse o sucesso, e que outras pessoas de mais capacidade, à vista de a Senhora fugir, a fossem buscar curiosamente, a que também Deus as moveria, e a descobrissem com algum final, ou se obrariam alguns milagres logo, motivo para que se resolvessem a lhe fazer de empréstimo alguma Ermidinha. Começou logo a mão de Deus a obrar tantos prodígios, que se animaram os seus devotos a lhe fazer depois Casa mais grande, como se vê, que é hum Templo majestoso, e de muita capacidade; e como as maravilhas, e os milagres cresciam, assim se aumentavam mais as esmolas, para que cada vez mais se ampliasse, e adornasse aquela Casa da Senhora.»

Transcrição, com ortografia adaptada, da descrição  feita por Frei Agostinho de Santa Maria na sua obra: "Santuário Mariano e História de Nossa Senhora...", Tomo IV, Lisboa 1712.

 

 


23 de agosto de 2020

UMA LENDA DA “JUSTIÇA DE FAFE”


Existem várias versões de lendas relacionadas com a famosa “Justiça de Fafe”. A meu ver, das quatro lendas que chegaram aos nossos dias, esta que aqui transcrevo, da terceira edição da Monografia da Freguesia de Fafe, apresentada em 2008, é a que melhor se adapta à iconografia do monumento à “Justiça de Fafe”, inaugurado em 23 de Agosto de 1981, nas traseiras do Tribunal local.

Contudo, estamos a fazer uma abordagem ao imaginário popular, como tal, todas as lendas merecem a nossa apreciação. Algumas até podem conter uma nesga de realidade.



«Um jovem rapaz filho de gente humilde, no dia das festas de Nossa Senhora da Misericórdia ou Senhora de Antime, enquanto assistia à passagem da procissão, viu a sua “trigueira”, bela e amada namorada ser apalpada no “traseiro” por um abastado fidalgo que visitava Fafe, tradicionalmente, pelas festas da “Vila”. O jovem namorado, embora ficasse muito ofendido, não quis “fazer peito” e pacientemente deixou passar a procissão. No final deste acto religioso, o rapaz dirigiu-se ao fidalgo fazendo-lhe sentir o seu desagrado pelo gesto obsceno feito à sua namorada momentos atrás. O burguês, tirando a sua cartola da cabeça, fá-la passar junto da cara do rapagão que sentindo-se uma vez mais provocado, quis lavar a sua honra, desafiando o ricaço para um duelo. O desafio foi aceite. No momento de escolher as armas, foi pelo próprio povo que assistia à discussão, pedido aos homens desavindos que mantivessem a tradição do jogo do pau. O ofendido aceitou esta escolha popular das armas.

Pelos presentes foram então entregues aos rivais dois valentes “lódãos”.

A escaramuça começou. Ouviam-se, de vez em quando, os gemidos de dor dos homens quando sofriam as fortes pancadas, misturadas com o som do bater dos paus. Os populares que assistiam a esta renhida luta batiam palmas.

Era o delírio, há muito que não se via uma rixa destas.

O pobre rapaz deu tamanha lição de pancadaria no burguês que, fugindo a “sete pés”, abandonou rapidamente a Praça, ouvindo ainda o grito de todos os populares:

“VIVA A JUSTIÇA DE FAFE”!

“COM FAFE NINGUÉM FANFE”!

 

22 de agosto de 2020

O PADRE “SANTO” QUE APRECIAVA E BENZIA OS SEIOS DE MULHERES QUE AMANENTAVAM OS FILHOS NA RUA

Capela da Senhora do Carmo anexa à Casa do Santo Velho
 


O relato de Ruy Monte no jornal “Justiça de Fafe”

 

«FIGURAS DO MEU TEMPO

Padre António

Por Ruy Monte

Eu não devia ter mais de dez anos.

Não tinha, não.

Juntamente com um companheiro da escola, comecei a ajudar à missa a este santo sacerdote.

Celebrava ele na capela do Santo Velho.

No fim de cada missa, lá vinha sempre a borracheirona e grossa criada daquela casa servir-nos o pequeno almoço. Café com leite e pão com manteiga.

Que bem nos caía aquele mata-bicho, depois de uma hora ou mais de prisão na capela!

- Presos? Presos, sim, mais de uma hora, porque o nosso querido Padre António tão santa e devotamente celebrava que chegava a parar em êxtase, na consagração.

Era preciso puxar-lhe pela alva:

-Sr. Padre António! Sr. Padre António! Já consagrou! Já consagrou!

Estremecia, como se acordasse… e voltava normalmente ao mesmo encantamento celeste…

 

 

Só conheço na língua portuguesa uma palavra que possa definir cabalmente esta figura singular da nossa terra: Santo.

Era realmente a santidade em pessoa, mas santidade verdadeiramente angélica, feita de todas as inocências da criança e dos místicos arroubos do anjo.

Tão simples, tão inocente, tão despido de amor de si próprio e tão longe das mais pequenas malícias até da criança, que dificilmente se compreendia como é que um homem pode tornar-se adulto e pode formar-se padre, sem chegar a conhecer o mundo e as suas maldades.

Mas também tão conhecida era de toda a gente a sua inocência que ninguém se escandalizava com os seus actos, por mais estranhos e anormais que parecessem.

Pois, às vezes, eram mesmo inconcebíveis em qualquer um de nós.

Toda a gente tinha a impressão de que o Padre António não andava neste mundo e que a sua evolução física e moral não tinha passado dos três ou quatro anos de outros tempos.

Era assim, certamente, que o nosso pai Adão cirandava no Paraíso Terreal, antes da parra e da maçã fatal…

Qualquer garoto o enganava com mentiras e desastres, que o punham logo a correr ou a rezar.

Qualquer mulher leviana lhe enfiava o braço na rua e o passeava no Largo, todo satisfeito com a sua companhia.

Qualquer falso pedinte lhe apanhava três ou quatro esmolas ao dia, sem dar por isso.

E era preciso que a criada Laurinda lhe escondesse dinheiro, roupas e géneros, para que ele não esvaziasse a casa!

 

 

Das muitas coisas estranhas que fazia quase diariamente vou mencionar apenas a que costumava praticar com qualquer mãe modesta, que encontrasse, na rua, a amamentar o filho.

Aproximava-se, muito lento e muito alegre, abria-lhe com toda a naturalidade a blusa, e erguia as mãos para o céu, balbuciando como os anjos hão-de cantar, certamente, no canto das onze mil virgens:

- Ai! Que tu tens muito leitinho para o teu menino! Deixa lá ver! Deixa lá ver!

Toda a mulher humilde sorria satisfeita, sem corar e sem revolta, mostrando os mimos, à vontade, que Padre António tocava com mãos de seda e logo benzia como um santo:

-Agora, agasalha-te muito e não deixes o menino passar fome.

Foi Deus que te deu esse leitinho todo para ele…

A criança continuava o seu pequeno almoço. A mulher compunha lentamente a blusa.

Padre António retirava-se, rezando as contas.

E, certamente, lá de cima, do Paraíso, Deus e os Anjos vinham espreitar tão formosa cena inocente, só própria dos tempos bíblicos, em que ainda Lusbel não reinava neste mundo…»

 

In: jornal “Justiça de Fafe”, nº 139, 11 de Outubro de 1979. P. 8.

 

Acreditando que Ruy Monte tinha dez anos de idade, esta crónica aconteceu pelos anos de 1912… O autor nasceu em 1902 


Reprodução do jornal "Justiça de Fafe", nº 139, 1972